Sei que a piadinha esta sobre a canção “Terra” das Tanxugueiras não é mui boa. Peço desculpas por ela.
Hoje vim no Twitter escrito em galego (o Galituitter) que um usuário acusava-nos aos reintegracionistas de que já nem sabíamos como é que fala um galego.
Talvez ele esqueceu que os reintegracionistas, para começo de conversa, somos na maioria galegos. Não podemos ver a fala galega desde fora, porque nós próprios falamos como fala um galego.
Mas no fundo o que ele dizia era que não conhecemos as fronteiras entre galego e português. Por considerarmos que galego e português fam parte da mesma língua é lógico que alguém pense que nem somos quem de deslindar ambas variedades.
É interessante. Ele punha o exemplo de alguém que começa a conversa dizendo “Oi, pessoal!”. Certamente não é uma expressão própria dos galegos. E também é certo que eu tenho lido cousas do estilo, e mesmo escrito, falando com uma audiência que na maioria são galegos.
Pois esta foi a minha resposta:
Tudo é questão de perspectiva, conhecimento e experiência. Normalmente não somos quem de saber as fronteiras entre galego e castelhano. Digo isto seriamente.
Podes saber que “cueva” é castelhano e “cova” é galego. Ok. Soam bem diferentes. Mas há inúmeros castelhanismos, e nem sempre sabemos diferenciar; porque alguns são indetectáveis agora. Não eram há 40 anos. Como “espera um rato”. Escuito isso sempre. Mas “rato” é um animal, não é? E todo o mundo di “vou dentro dum rato”, mas é absurdo… porque uma pessoa não colhe aí. E essa é só uma das expressões castelhanas insertadas no galego. Há também muito léxico que vai entrando, e até as vogais abertas/fechadas começam a se neutralizar na fala popular pola influência do castelhano e o galego xunteiro (outra ferramenta castelhanizante, penso eu).
Total: o galego está-se diluindo já no espanhol. Completa e irreversivelmente. E “não há fronteiras” aí. Então convém considerarmos a perspectiva. Eu tenho casa em Portugal, no norte. Ali não tenhem quase castelhanismos. Mesmo atrapalha a comunicação dizer “bueno”. Para os leitores lusófonos, quero aclarar que “Bueno” é começo de frase bem habitual no galego: “Bueno, já sabias que isso não convinha fazê-lo…”
Desde essa perspectiva, a de alguém que tem um mínimo contacto com o português, descobres que é possível falar galego sem meter castelhanismos. E conhecendo isso, os “dentro de um rato” soam FATAL. Este contacto com o português tem o efeito de que começas a evitá-los.
E bem pode ser que ao princípio o contacto com o português, que vás intensificando (porque costumas ver filmes, séries, ter conversas, etc) tenha o mesmo efeito que o espanhol: custa diferenciar onde é que começa o galego e acaba o português. E com mais razão mesmo que com o espanhol, porque basicamente são a mesma língua com pequenas variantes.
E ti estás a tentar evitar o uso de castelhanismos desnecessários, lembra. Daquela vai entrando a terceira cousa que dixem: A EXPERIÊNCIA. Com o tempo podes ir delimitando melhor as fronteiras da tua variedade, galega, dentro desse universo lusófono. E quando queres dizer algo, escolher com mais conhecimento a palavrinha. Que estás falando de forma informal? Pois talvez gostas de usar “Oi, pessoal!” porque adoras essa expressão ainda que nem sabes se é de Portugal ou Brasil. Ou dis “Que passa, chavales!” porque é castelhano, mais gostas.
Ou dis “Opa, gentalha!” porque escuitache um ferrolão a dizer isso um dia. E sabes que gentalha é algo ofensivo, mas depende do contexto. E qual é a forma 100% galega? Talvez nem o sabes já, porque tudo está misturadinho na tua cabeça.
Então, qual é para mim a conclussão?
Pois é simples: quando tés input linguístico doutra língua ou doutra variedade da tua língua, a influência é inevitável. Daria um trabalho imenso desbotar todas as vezes que escuitache uma expressão bacana, fixe, molona.
E no geral, o bombardeio de castelhano na Galiza é tão constante e inevitável que mesmo chegamos a pensar que a maioria das expressões que estão na rua, nos Media ou em Internet formam um contínuo com o galego. Ouvir “dentro de un rato” é o normal. E interiorizamos isso sem nos decatar que não tem NADA de galego.
Do mesmo jeito, se na tua casa escuitas continuamente expressões portuguesas e brasileiras na TV, Netflix, Internet, podcasts… interiorizas igualmente essas expressões e talvez um dia digas sem notar que não é típico do galego, algo como “Oi, pessoal”.
E pergunto eu… por que devemos ser permissivos com “dentro de um rato” e não com “oi pessoal”? Por que consideramos que a segunda ataca à essência mesma do galego e a primeira não?
Desde a minha perspectiva, fai mais dano a primeira. Atenta contra a estrutura mesma da língua, traz um significado novo para o pobre ratinho que só queria comer grão. E a segunda é só uma expressão festiva, mais inocente. Que tem menos uso e menos impacto. E até moderniza o galego com algo chegado desde o nosso universo linguístico. É uma achega.